Autor: João Sousa
O imaginário coletivo possui certos anseios e desejos que parecem existir desde sempre. Nós queremos fazer coisas como voar, ir para o espaço e andar em novos planetas, queremos pisar na lua e no local mais profundo da Terra, e claro… queremos viver para sempre. Ou pelo menos o máximo de tempo possível.
Se liga nisso: a gente trabalha incansavelmente para aumentar a nossa expectativa de vida. A gente fala sobre longevidade, busca a cura para todas as doenças e conseguimos resultados positivos. Em 1940 a expectativa de vida de brasileiros e brasileiras era de 45,5 anos, em 2019 nossa expectativa era viver até pelo menos 76,6 anos. Estamos alcançando nossos objetivos e mais uma vez nos aproximando do impossível. Mas talvez a gente precise também fazer uma reflexão importante: e agora?
Estima-se que aproximadamente 14% da população brasileira tenha 60 anos ou mais, e esses números estão crescendo. Até 2047 estima-se que o número de pessoas com 65 anos ou mais seja equivalente a 25,5% da população. Seguindo a tendência mundial, estamos nos tornando um país com uma população mais madura. Atualmente o número de pessoas com mais de 60 anos já é superior ao de crianças com até 9 anos de idade.
Almejamos a longevidade, mas não valorizamos quem já chegou lá. A gente quer viver muito, mas o envelhecimento nos assusta tanto quanto a morte. Esse local desconhecido da vida, que é a terceira idade, faz com repliquemos comportamentos muitas vezes preconceituosos, afinal é muito mais fácil rotular sem conhecimento do que lidar com aquilo que não queremos aceitar. Esse tipo de preconceito tem nome: é o etarismo. A intolerância contra pessoas idosas pode acontecer de várias formas, seja através de frases como “você não tem mais idade pra isso” ou através da exclusão no mercado de trabalho.
E já que estamos falando sobre preconceitos, se realizarmos o recorte do percentual de pessoas idosas em contraste com a renda vemos que: a população idosa entre os 5% de pessoas mais ricas do Brasil é de 17,44%, enquanto na população que ocupa os 5% mais pobre é de apenas 1,67%. Envelhecer também é um privilégio.
Se o panorama geral já parece desfavorável para qualquer pessoa que chega à terceira idade, o que podemos esperar para esse 1,67% da população que consegue sobreviver à pobreza e à desigualdade? O desamparo que acompanha essa parcela da população durante toda a sua vida parece se intensificar à medida que os anos passam.
Sobreviventes de um longa batalha, essas pessoas ainda têm que lidar com as estatísticas desaforáveis sobre saúde mental na terceira idade. A depressão atualmente atinge 13% da população entre 60 e 64 anos de idade, enquanto isso o índice de autoextermínio de pessoas acima de 70 anos é de 8,9 a cada 100 mil habitantes, entre pessoas jovens esse número é 5,8 pessoas para cada 100 mil habitantes.
O debate sobre qualidade de vida na terceira idade é, mais do que nunca, extremamente necessário. Mas também se faz necessário que a gente analise o quanto do discurso já existente parte de uma premissa elitista, e conversa apenas com os 17,44% da população que tem condições financeiras para envelhecer bem e com dignidade.
Foram a partir desses questionamentos que criamos no FA.VELA o programa Perifa 60+, cujo objetivo é promover a qualidade de vida de pessoas periféricas na terceira idade. Através do desenvolvimento de habilidades digitais, empreendedoras e de liderança, a gente quer promover o envelhecimento de qualidade da periferia.
Fonte: https://www.futura.org.br/